COM OS BOLSOS VAZIOS

Para onde terá fugido a minha alma nesta manhã cheia de sol e ausência? Certamente para uma solidão dos campos sem fim, em busca da tua, em algum canto onde as flores estejam crescendo, e se elas se encontraram devem estar se amando sobre a superfície do verde batida pelo vento, com os olhos voltados para o azul, justamente como faríamos se não existisse toda a confusão que nos rodeia.
“Não, Joana, não diga isso. Nós não vamos nunca nos deixar.”
Quando naquela noite as nossas mãos foram asas e tocaram mais fundo as nossas carnes, eu soube já o encontro definitivo dos nossos corpos, mas a união às vezes é instável, por isso contive o grito e o gesto.
A linguagem do corpo por vezes nos funde, nos faz um só, e na cama pela qual rolamos eu sabia a chegada, mas embaixo dela a terra, e nesta eu sabia também o fim do caminho.
Por isso tive medo.
Os nossos carinhos ontem se enfureceram um pouco, as nossas mãos se procuram mais no fundo, e mais loucos do que as outras vezes os nossos corpos se apertaram, mas tivemos medo de ver os nossos corpos grudados e as pessoas nos puxando, tentando arrancar dos nossos lábios o grito que nunca chegaríamos a dar.
Somos dois, Joana, cada um com uma paisagem diferente diante dos olhos, cada um com um destino nas mãos. Você a dizer o teu destino em mim, eu a saber o meu destino em você, e a impossibilidade de continuar nos esmagando. Somos dois corpos quase fundidos na noite, sem destino, viajando quase livres.